sexta-feira, 26 de agosto de 2011

postheadericon MUSICALIDADE NO ATOR


É antiga a busca da musicalidade no fazer do ator. Desde os primórdios o teatro clama por um diálogo com a música. Esse diálogo pode se dar em diferentes níveis, desde a trilha sonora até a apropriação da música como forma de expressão, passando por inúmeras possibilidades.
Nessa busca se lançaram inúmeros gênios do Teatro. O próprio Constantin Stanislavisky, Vsevolod Meyerhold, Richard Wagner, Bertold Brecht, Antonin Artaud, Etiene Decroux e Bob Wilson, entre outros. Todos, à sua maneira, traçaram fricções com a música e sua utilização por parte do ator, mas certamente é neste último que ela foi levada às últimas consequências.
Em Stanislavsky, encontramos a questão do tempo-ritmo, que afeta a fala e o corpo do ator, produzindo estados internos e externos capazes de revelar o que está sendo vivenciado em cena. Foi o início de uma sistematização, que permitiu sua evolução para a forma como conhecemos hoje.

Meyerhod, aprofundou essa visão, quando passa a desenvolver conceitos nos quais se inserem a música e no trabalho do ator, como acentos e suspensões no movimento e na fala. Para ele Teatro Musical é todo gênero artístico que traga fricções em vários níveis entre teatro e música, em relações que nem sempre serão de equivalência, dada sua complexidade e possibilidade de variação.
A partir de seu trabalho, chegamos a crer que o ator deve conhecer/ter conceitos musicais bem desenvolvidos para ser capaz de compor uma interpretação a partir de diálogos entre as músicas, audíveis e inaudíveis, valorizando o texto (em sentido amplo), estruturando-o e aprofundando seu sentido.

Assim, a musicalidade num espetáculo teatral pode vir de inúmeros lugares, dentre eles:
a) fomentada pelo(s) diretor(es)
b) extraída do texto
c) "bagagem" do ator

Acreditamos, então, que o espetáculo deve ser construído como uma sinfonia, mesmo quando a música não é escutada, mas pelo impacto emocional, lírico ou crítico conseguido com o texto.
A música resulta do movimento. Tudo que vibra mais de 16 vezes por segundo se torna audível ao ouvido humano. Mas nem tudo que é audível é música. Nesse momento é importante trazer o conceito de música hoje .
Quando todos esses grandes estudiosos do teatro falaram de música e cena, tanto uma quanto outra coisa eram bem diferentes das dos dias atuais. Para isso nos socorremos de Murray Schafer, para quem música é uma experiência estética cumulativa e não excludente, a organização de sons (agregando ritmo, melodia e silêncio) com a intensão de ser ouvida. Assim o ruído é a expressão indesejada, planejada ou não.

Podemos dizer então, que há musicalidade no fazer do ator, quando este acumula em seus movimentos, olhar, respiração e nos sons que emite, experiências estéticas com a intenção de serem vistas, ouvidas, sentidas ou apreciadas.

Para exemplificar a utilização de musicalidade no trabalho do ator, escolhemos trechos de vídeos de espetáculos e de experimentos realizados sob a orientação do professor Marcos Bulhões no CAC-ECA-USP, na disciplina “Encenações em Jogo: experimentos de criação e aprendizagem do teatro contemporâneo”, que servem como referências dos processos que culminaram em apresentações musicalizadas.

Robert Wilson, que além de grande encenador é artista plástico, ligado à dança e ao teatro, conheceu o trabalho de Martha Graham, com quem fez “Snow on the Mesa” e de Alwin Nikolais, de quem foi assistente técnico. Esteve ligado aos happenings, inicado pelo músico John Cage, entre outros é um artista com muita disponibilidade para a música.
Exatamente por isso produz inúmeros espetáculos onde a musicalidade é notória e essencial na construção e na expressão artística. Podemos citar duas obras dele: “Shaekspere’s Sonette”, espetáculo onde a música é a comunicadora. A utilização de sonoridades e tempo-rítmo é extremamente necessária para a construção cênica, marcando as ações dos tipos apresentados, e “Einstein on the Beach”, a música é provocadora de emoções, também presente nos corpos dos atores, não pela mera coreografia dos movimentos, mas pela composição que geram.
Em sua encenação a musica é um dos motes centrais, uma vez que tudo se relaciona a ela, que determina o tempo e o ritmo dos atores, das cenas e do espetáculo, em movimentos de concordância ou dissonância, ou ainda em polifonia em relação a ela.

Existem fontes nacionais também. No espetáculo “Rainha(s) – Duas atrizes em busca de um coração” a musicalidade pode ser percebida nos movimentos das atrizes, em seus olhares e principalmente na utilização das pausas e suspensões.
Em nossos experimentos, realizados no primeiro semestre de 2011, tanto no grupo 1 quanto no grupo 2, podemos notar a importância da música e da musicalidade nos resultados obtidos. Obviamente a influência de Bob Wilson e Pina Bausch conduziram a isto.

Note que nem sempre a musicalidade em cena é o foco principal do diretor ou do ator, mas quando presente conquista um resultado que conecta no público um lugar onde ele pode completar a comunicação e ela acontece com maior facilidade. Esta busca encontrou em Bob Wilson uma grande expressão e escola, que certamente vale ser estudada.

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